... Se o mar se revolta e o vento o abraça é porque quando o mar e o vento se tocam é assim uma espécie de paixão avassaladora, duradoura e violenta. Um encontro de vento e mar raramente será sereno, talvez um dia entre na velocidade de cruzeiro mas sereno nunca! Aqui de cima, por cima das nuvens, a frase "a nuvens são blocos de gelo" faz hoje sentido. No nosso imaginário as nuvens são pedaços de algodão leve e fofo. Estas não são. Estas são ásperas, duras e frias. Estão geladas de ver o vento abraçar o mar com toda a força e o mar cuspir o abraço com o desprezo do tamanho do seu infinito. O gelo das nuvens fica, aqui na perfeição. Faz a barreira, a filha da puta da barreira que não deixa o sol acalmar a força do vento e atenuar a revolta do mar. Eu sempre gostei de vento. Eu nunca gostei de mar. Tinha medo. Abracei-o já tarde. Talvez tarde demais. Embrulhei-me em ondas que me despiram, me mandaram contra a areia me expuseram mas nunca me revoltei com ele. Ri-me com ele. As ondas violentas do mar faziam-me cócegas porque havia um braço que me roubava delas. O vento abraça-me sem pedir autorização. Arrepiava-me a pele que pedia mais mar como se fosse uma criança a brincar dentro de um alguidar. Hoje, aqui de cima, vejo as nuvens como blocos de gelo. Paredes mais ou menos grossas que me gelam e não me deixam ir ao mar nem que o vento me abrace... Um dia. Talvez um dia as nuvens voltem a ser de algodão, porque se o mar se revolta e o vento, pacientemente, o abraça, as nuvens podem aos poucos derreter. Depois chove. O céu chora. A chuva cai ao mesmo tempo num mar revoltado e numa pela arrepiada. Um dia.
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