«A televisão estava desligada e conseguia ouvir um vento encrespado que soprava e entrava pela fresta das janelas ainda nuas de cortinas. O barulho parava quando o vento era encurralado por algum paredão. Estava ali parado no tempo e dava-me conta que o tempo corria muito depressa. Há quem diga que “o tempo é o que se faz dele”. Gostava tanto de ter feito do nosso tempo uma história mais bonita e muito mais feliz…»
«Adormeço ao som de uns carros que vão passando de longe em longe e do vasculho dos homens da junta que tentam varrer as ruas molhadas e enfeitadas com as folhas verdes que caíram com a força da chuva. Fecho os olhos e sinto o tempo escorrer-me pelas mãos ao som de um tic-tac que o despertador vai fazendo. Nunca fazemos isso, mas já viste que o tempo pode sentir-se se ouvires cada segundo a passar. Não lhe damos valor, mas cada segundo que passa é menos um segundo que temos e leva com ele tantas coisas. Tantas coisas que cabem num segundo e que ficaram lá atrás, irremediavelmente aprisionadas no passado.»
In Abraça-me
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