… Encontrei o Manel (Foi disto que me lembrei)

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… Há dias dei de caras com esta fotografia onde estou com o Manuel Luis Goucha. Não foi preciso muito para rapidamente fazer uma viagem de quase vinte anos e reconhecer o instante em que foi capturada a imagem… Sempre gostei de o ver trabalhar. Sempre! Tenho na memória a sua colaboração no ‘Eterno Feminino’, o seu salto  no ‘Olha que Dois’ com a Teresa, tenho na memória os ‘Momentos de Glória’ quando a maioria se roeu de inveja por ter sido o Manel o escolhido para receber tantas estrelas mundiais na TVI e lembro-me de pensar, na altura, que  lhe deviam cortar o bigode que lhe ficava mal todos os dias, vi-o crescer na ‘Praça da Alegria’ e nos programas da manhã no Porto antes da ‘Praça’, vi-o sair para a TVI… Fui vendo coisas, fui crescendo com ele do outro lado do ecrã e ele foi crescendo muito e, por muito crescido que estivesse, nunca lhe notei a falta de preparo ou descaso. Não deve haver na televisão um apresentador –  homem – que se prepare tanto para apresentar day time com o Manel. O day time (horário da manhã e tarde) é um horário nobre, ao contrário do que pensa a maioria. É preciso um estofo incrível e um preparo de alma muito grande para que o público deposite os seus dias, as suas histórias, a sua confiança e a sua escolha a um apresentador que lhe faz companhia todos os dias à mesma hora. O trabalho começa logo com qualquer profissional a respeitar o horário, olhar para ele com a humildade de quem tem que o ter entre mãos muito cuidadosamente, tem que o tratar com afecto, porque em última análise o que ali está são os olhos e o coração de muitas pessoas àquela hora. Não raras vezes, àquela hora, somos a única coisa de muitas pessoas.  É perceber que não há assuntos menores, que todos os assuntos são dignos de um momento televisivo bem feito, bem embrulhado, bem contado. Que todos precisam de atenção, que do outro lado está uma pessoa a ouvir atentamente, porque quer saber, porque está curiosa, porque tem uma história igual ou porque apenas se quer divertir e sentir qualquer coisa, que não consegue sentir com mais nada, além da emoção que lhe dá a televisão. A televisão é isto! Na prática, é deixar de ser apresentador para ser um espectador igual aos outros. Isso é um aprendizado de anos, que só se consegue com a sabedoria e humildade dos grandes. É isso que admiro nele… muitas vezes disse que vê-lo trabalhar é melhor que estar metido numa sala de aula a aprender qualquer coisa que alguém diz, mas que não sabe como na prática funciona. Sempre lhe segui os passos, os gestos, a curiosidade… De tudo isto me lembrei a olhar para este retrato, que quando foi feito eu apresentava (mal) na TVI o ‘Olhó Vídeo’ e o Manuel o ‘Olá Portugal’. Eu colaborava na Tv7 Dias, onde todas as semanas entrevistava pessoas que admirava. O Manel foi um dos primeiros (feito que viria a repetir anos mais tarde no jornal 24 Horas)… Fui ter com ele aos estúdios da Nova Imagem e o mote da conversa eram as gravatas – na altura o Manel tinha uma colecção imensa de gravatas, já não tinha bigode e eu tinha os olhos muito abertos e um cabelo que ainda hoje não se explica. Cheguei muito mais cedo que o previsto e ali fiquei, sentado numa escada de metal a vê-lo fazer acontecer. Lembro-me de o imaginar muito rápido, eficaz, despachado e lembro-me de pensar ‘É isto! É isto que quero!’. Já sabia há muito tempo o que queria fazer na televisão, mas ali tive uma certeza maior. Tive a certeza que os homens podem fazer bem day time, não tem que ser uma coisa cinzenta, obsoleta, enfadonha. Pode ser animada, colorida, divertida entretida e ao mesmo tempo séria, respeitada e de referência. Sempre disse que este é um horário de mulheres. É feito e pensado para elas em qualquer lugar do mundo, basta conhecer um pouco da televisão para saber isso. Aos homens cabem poucos pedaços e esses pedaços raramente eram bem aproveitados até que chegou o Goucha e coube-lhe um pedaço grande… Um pedaço que é dele por direito, por sabedoria, por mérito e por inteligência. Se tivesse parado no tempo, tinha sido apenas ‘mais um’. Não parou, aproveitou todas as oportunidades, meteu a primeira e foi de viagem desbravando caminho, adaptando-se a realidades diferentes das que vive, explorando o que podia explorar, aliando-se a uma modernidade que fazem dele o melhor em Portugal. Não há outro tão bom como ele, e era ele que eu gostava de ser um dia. É nisto que gosto de me inspirar. Não numa cópia, não gosto disso, mas numa inspiração. Ir buscar o muito bom dele e misturar no que tenho de característico meu. Digo-lhe isto muitas vezes. Chamo-lhe Rei ele chama-me Príncipe. Chamo-lhe porque acho mesmo que é, não porque lidera as manhãs, por isso não! Porque há programas que não lideram que são muito melhores do que os que lideram, até porque, neste caso, nem sequer acho que o ‘Você na TV’ tenha os melhores conteúdos, acho mesmo que o meu programa, feitas as contas, tem muito melhor conteúdo que o dele. Não é essa a questão, até porque estou convencido que mesmo que o Goucha tivesse só um espectador por dia, seria o melhor homem a fazer televisão em Portugal porque não descuidaria o brio. É assim que gosto de televisão. Televisão como Eu a entendo. Como Eu gosto de a fazer. Não é por ser extremamente culto, que isso aprende-se nos livros e na vida, não é por ser extremamente bonito, porque ele não tem a cara do Vitor Baía nem o corpo do Paulo Pires, não é por vestir colorido que isso qualquer um pode vestir, não é por dizerem que faz tudo bem, que há coisas que faz com as quais não me identifico nada e nem faria igual … É talvez por estar tudo misturado em parcelas quase esquizofrénicas de talento e alma televisiva que passa quando se gosta de televisão à séria. Muita gente vai dizer que sou exagerado, mas eu, que sei como funciona a televisão, sei que não sou. Que não estou a ser… Ao Manel, também há de ter sido difícil e complicado chegar aqui. Não foram ‘favas contadas’ de certeza, e é nisso que penso quando, num dia ou outro estou mais desanimado – lembro-me sempre dele e digo para mim: ‘Um dia alguém em casa vai achar de mim o que eu acho dele’. Eu sei que muita gente me segue, gosta do que faço e como faço e não tenho em mim palavras de agradecimento para isso, mas acho que entendem o que quero dizer. Não é ingratidão, é vontade de fazer mais e melhor. Só assim faz sentido!…  A televisão é feita destes momentos de magia. Assim como a nossa memória! Não há nada mais mágico do que a memória e o que temos dentro dela. Foi a olhar para esta fotografia que me lembrei de tudo isto agora. Só porque sim, até porque quem me conhece, sabe que gosto de me perder no tempo a olhar para imagens  que ficam sossegadas nele.

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