…  Esta fotografia não tem filtros nem tem grande qualidade. Tem história. Um portão esfolado que revela as tantas camadas de tinta que já teve em cima. A ombreira dele toda esfolada que exibe as camadas de tinta que já escondeu. Uma parede pintada vezes sem fim de cal que ferve em água antes de se espalhar nela, para que, as duas juntas, façam o Alentejo mais fresco. Hoje, não está cá ninguém. Já esteve. Já se abriu muitas vezes, já se ouviram gargalhadas do outro lado deste portão. Do outro lado já houve vida. Hoje há silêncio e o barulho de vegetação quando o vento aparece e varre com ele pedaços da Vila inteira que deposita noutros pedaços de Vila quando acalma. O chão já foi terra. Depois pedra. Hoje é só alcatrão sujo pelo vento. Este portão pode ser o de qualquer um de nós porque todos já nos cruzámos com um lugar assim. Os anos passam e se não temos cuidado, com o passar dele a vida esmorece nos lugares por onde vamos passando e podemos um dia passar e deixar de lhe ver vida. Fica só o que era, a lembrança do que foi, mesmo que tenha sido muita coisa para muita gente. Este é só um portão esfolado. Mas já foi um portão pintado de fresco.