… Ontem e hoje!

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… Esta semana eu e a Maria recuámos no tempo e fomos até às fotografias que nos tiravam na escola primária. É bom recordar. Naquele tempo era uma criança. Quando olho para esta fotografia, vejo nela um punhado de vontades que tinha na altura e que sentia que se tornariam verdades. Tinha os olhos muito abertos, assim como os tenho hoje. Eram arregalados, amendoados, um castanho que, de vez em quando, fica meio verde. Tinha esperanças dentro, antes de ir acabando com elas. Ficaram os olhos muito abertos à mesma, mas hoje já com as marcas que o tempo lhes trouxe. Cresci muito depressa. Fiz-me bem-disposto, porque não entendo a vida de outra maneira. Vamos crescendo e aos encontrões, percebemos que o que deixa de nos fazer criança não é o calendário. É a força com que a vida se agarra a nós e decide fazer o que quer. Não há tempo para nos explicarem que é demasiado complicado deixar de ser criança. Devíamos ser crianças muito tempo. Talvez sempre. A idade da inocência é a mais feliz, mesmo quando achamos que pode não ser. Acreditamos mais, logo, somos mais felizes. Sabemos menos, logo, somos mais felizes. Somos sempre mais felizes quando ainda acreditamos em alguém ou em alguma coisa. Em criança, nunca me avisaram que um dia ia deixar de acreditar. Não se pode cortar assim, a meio, aquilo que pensamos do mundo. Nem me disseram isso nem me explicaram que ia aparecer gente que me maltrataria, que iriam aparecer situações com as quais não conseguiria lidar, que ia ter contas para pagar, agenda para cumprir, ou que, quando crescesse, iria ter de construir uma máscara para enfrentar a idade adulta com a mesma verdade com que a imaginava em criança. Ainda assim, não me zanguei com a vida nem tenho saudades de ser criança, embora ninguém se tenha chegado ao pé de mim para dizer: Cláudio, vai devagar, que isto não é almofadado e podes magoar-te a valer. Aprendemos quando crescemos muito depressa que o que queremos é ser pequenos outra vez. Queremos ser outra vez inocentes para acreditar que a vida é uma criança que teremos de embalar, cuidar, respeitar até que adormeça. Estes olhos, grandes e meio desorientados, já foram alegres, histéricos, extasiados, tristes, humilhados, ofendidos, orgulhosos, medrosos, corajosos, envergonhados… São os meus olhos. Abertos. Muito abertos a quem foram roubando a capacidade de brilhar.

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