Por

Os pés de barro da notoriedade!

Todas as semanas na minha caixa de correio electrónico aparecem pedidos de entrevistas para os mais variados órgãos de comunicação, rádios, blogs, sites, jornais, revistas…. Não se pode responder a todos porque senão corremos o risco de não ter nada para dizer e de deixar de ter tempo para fazer o que nos apetece. Eu pessoalmente só respondo por escrito – experiências passadas dizem-me que desta forma nos defendemos melhor. Um destes dias, o responsável pelo blog Zé de Melo, de Elvas pediu-me de forma simpática que lhe respondesse a umas questões. Sempre que tem que ver com o Alentejo, com Elvas e especialmente com Vila Boim estou sempre pronto. Respondi na hora…
O que me despertou a curiosidade e me suscita a vontade de escrever esta crónica, prende-se com o facto das pessoas acharem que existe naqueles que querem voar mais alto a possibilidade de não sair do Alentejo. Não existe outra forma! No meu caso pessoal, sustentei durante muitos anos a vida complicado de diariamente andar entre Lisboa e Vila Boim na esperança de que as minhas raízes não se perdessem. Foi impossível. É impossível, fisicamente ficarmos presos ao nosso habitat apaixonado, quando a nossa vida profissional está longe. É em Lisboa, onde vou buscar o dinheiro para continuar a ter uma boa vida no Alentejo. É desta janela no centro de Lisboa com vista para o Jardim da Estrela que me inspiro, para sustentar uma casa no Alentejo que tem vista para uns olivais que aos poucos se foi transformando numa espécie de condomínio privado onde amigos de infância constroem casas e projectam ser felizes.
O acto de abandonar a raiz e a cidade onde criamos hábitos é profundamente dolorosa e mesmo que durante dois dias da semana o Alentejo seja a nossa casa, deixa de o ser aos poucos mesmo que esse não seja o nosso objectivo. O café que frequentamos, as pessoas a quem dizemos bom dia todas as manhãs, os carros que encontramos diariamente nas rotundas… deixam de existir e já não fazem parte da nossa normalidade. Cada dia que passa, a imagem que se tem de um sonho de vida idealizado durante anos que seria num cenário que escolhemos, deixa de fazer sentindo… Não me acontece só a mim. Claro que não! Acontece a quem estuda contabilidade, economia, advocacia, medicina, ou quem pura e simplesmente quer ter novos horizontes e tem a certeza de que no Alentejo, na nossa cidade, por muito amor que lhe tenhamos as coisas não fazem sentido a partir de determinado. Fica a pergunta: Lutar por um habitat onde nos sentimos bem, mas frustrados profissionalmente? Ou seguir o sonho da realização profissional deixando para trás todos os “bons dias!” que diariamente dávamos a quem se cruzava connosco na calçada da rua da Carreira? A vida tem destas escolhas. E ao contrário, do que me perguntava o Zé de Melo, eu não sou diferente porque sou uma “figura com notoriedade”. A mim talvez me custe mais, porque acrescido ao enorme sofrimento de estar longe do cheiro da terra que amo há 33 anos, vivo com a frustração de justificar constantemente que o Alentejo não é no fim do mundo, e que há muito tempo deixou de ser só a imagem de gente idosa sentada na soleira da porta a ver um tractor passar com tarros de cortiça onde tudo se faz muito lentamente. Quando me perguntam o que me prende ao Alentejo, eu continuo a dizer que é a verdade da gente que não encontro em mais lado nenhum, com milhões de defeitos que lhe encontramos todos os dias…
E a crónica acaba aqui, que tenho que mudar de roupa e rumar à Expo onde vai acontecer uma recepção importante. Vou ver gente a sorrir para mim e para a fotografia com a palavra hipocrisia estampada na testa. Imaginem: vocês saírem de casa a caminho do Nautilus sábado à noite onde sabem quem vão encontrar, onde e a fazer o quê, correndo o risco de quase adivinharem o que vão dizer uns aos outros. Como podem ver não é tão diferente. Têm é mais sorte!

Sem tags

Blogs do Ano - Nomeado Entretenimento