... A vida tem curiosidades boas, felizes e que nos mostram de verdade que isto anda em ciclos, há quem diga que são de sete anos, há quem diga que são de dez… eu ando ali pelo meio talvez, mas não acho que venham uns a seguir aos outros ao acaso. Acho que andam em ciclos de tempo, para que se entenda o caminho que fizemos e dele tirar lições, aprendizagem e acima de tudo olhar com olhos de gratidão pelo que se passou e encontrou no caminho até se chegar aqui. Durante estes dias vi muitas vezes a minha escola primária, aliás, se for honesto nunca deixei de a ver porque como sabem nunca deixei de viver no Alentejo, ainda que passe a semana toda em Lisboa. Por isso, me irrita tanto quando se escreve que ‘Cláudio volta ao Alentejo’, ‘Cláudio vai viver no Alentejo’ ou pior ainda ‘Cláudio vai passar reforma no Alentejo’, como se isto fosse novidade, sendo que quem me segue sabe que nunca deixei o Alentejo, onde tenho a minha filha, a minha família, a minha casa desde sempre, onde faço compras, onde participo activamente e onde exerço todos os meus direitos… tudo isto apenas para vos dizer que tenho muito claro o lugar das minhas raizes, e uma delas esta aqui. Nesta escola. Uma escola primária como muita gente imagina as escolas primárias e por isso, por saber que uma das raízes está nela, que tenho de vez em quando saudades. Tenho saudades da minha escola porque acho que na verdade tenho saudades de tudo o que me prende àquele tempo e que me lembra os amigos, a infância e os dias de chuva onde eu, por trás de um vidro molhado sonhava com as luzes da vida. Nunca ninguém naquela escola acreditou em mim, é um facto, mas mais forte ainda foi eu nunca colocar em causa a minha capacidade de ter forças para correr atrás dos sonhos. Se fechar os olhos, vejo-me nitidamente e brincar nas escadas, que eram gigantes na altura, aos festivais da canção, a programas de rádio ou a desfiles de moda, enquanto os meus companheiros de classe jogavam à bola num pátio cheio de lama guardado em cada intervalo pela menina Lurdes ou pela Maria ‘salaoia’, que eram na altura as auxiliares que nos ajudavam, vigiavam e controlavam os nossos passos. Tenho a nítida imagem das duas. Uma de uma lado, a outra do outro. Mais tarde veio a Dona Catarina, mas nessa altura já eu estava de saída. Adorava a minha professora da primária, a D. Conceição. Acho que na altura era uma espécie de ídolo para mim. Gostava como ensinava, como se vestia, o que usava, o que dizia. Era uma referência, e parte do meu gosto por ler e escrever veio dela. Ela era entregue e tratava os alunos de forma muito bonita. Sempre percebi isso. Ela era uma mulher bonita. Elegante, lembro-me de no Inverno usar botas de cano alto. Tinha uma figura imponente, de respeito, mas próxima. Infelizmente a memória que tenho diz-me que nem todos os professores faziam o mesmo. E isso, a esta distância deixa claro que não deviam ter sido professores, porque eu sou muito hoje daquilo que tive aqueles seis anos nesta escola. A minha escola ainda está no mesmo lugar, pintada a cada ano de forma a ser conservada. Os professores são outros, os alunos também mas na mesma escola e na mesma sala de aula – a última do corredor do lado esquerdo – tive o orgulho de ver estudar a minha filha que entretanto deu o salto e este ano se tornou universitária. É um orgulho para qualquer pai, para qualquer educador. Se fizer um paralelismo e pensar um pouco, acho que a minha professora, se ainda se lembrar de mim também sentirá orgulho, porque vê que aquilo que me ensinou teve o seu seguimento… Nem todos conseguiram, mas isso é outra história.
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