… E cheguei aos 44 ( Não posso dizer que não bate, porque bate!)

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… Sou dos que gosta de celebrar as datas e de lhes dar importância. O dia dos meus anos é a minha viragem do ano, muito mais importante que o réveillon. Gosto de fazer festa, de ter gente à volta, de receber mensagens, parabéns, presentes, atenção… Mas também gosto (muito) do silêncio que escolhi para este dia. Sei que é contraditório, mas por opção neste dia raramente atendo o telefone, não vejo as mensagens e, se responder, faço-o mais tarde. É dia de festa, mas também de reflexão. Sempre! O meu lado mais apurado (que será também o feminino) é o de estar constantemente a tirar a temperatura a tudo. Faço-o com frequência, não seria diferente no dia em que assinalo 44 anos. Olhando para trás, e em traços muito largos, tenho a vida que escolhi. Faltam-me coisas, mas tenho tantas outras boas que acho injusto pedir seja o que for. Acredito que Deus terá ainda muitas coisas boas reservadas para mim que serão concretizadas com um forte empurrão desta força de vontade que tenho e que herdei da vida. Estou contente com ela (com a vida), mas de vez em quando sinto uma espécie de frio que se instala dentro com a falta do quente que não se compra na loja mas, em abono da verdade, devo dizer que sempre achei que seria o preço a pagar. Vou andando, disfarçando, rindo num lado e outro, mas no fundo sabia que o preço a pagar seria o tal frio que de vez em quando se instala, que não chega a deixar-me congelado, porque há tanta coisa quente e boa (como as castanhas) a acontecer-me que o que preciso é olhar para elas e valorizar cada uma de forma preciosa. A cada ano gosto de fazer coisas que me superem, que me desafiem, que me marquem. Gosto de me fazer presente, de olhar para trás e perceber que cresci a todos os níveis e este ano não foi diferente. Muito trabalho, muito projectos, muita realização, coisas construídas pessoal e profissionalmente. Assim vale a pena olhar e perceber que os doze meses que passaram não foram em vão. Cresci muito, apreendi umas coisas, ensinei outras, tenho a certeza! Perdi algumas coisas, porque eu sou da opinião que quando se escolhe se está sempre a perder. Estou mais assertivo, selectivo, mais rigoroso mas menos caprichoso, menos cheio de mim. Mas continuo teimoso, apaixonado, vaidoso, a amar o azul escuro, o cheiro a torradas, a cama feita de lavado, a café acabado de tirar, a casa a cheirar a limpo, um restaurante com pouca gente, uma esplanada ao fim do dia, férias em lugares que me são confortáveis, vontade de conhecer gente que não me conhece, mas acha que sim. Aos 44 anos continuo a achar que poderia viver em Barcelona, que comprava uma casa em Amesterdão, que trabalharia em Madrid, que Paris é a cidade para se escrever poemas e romances, que Itália foi das maiores surpresas da minha vida, que o Alentejo será sempre o meu lugar, que a minha casa nova foi uma boa opção, que jantar nela com amigos é muito melhor que no mais requintado restaurante, que falar de tudo e mais alguma coisa com eles é a melhor escola que podemos ter, que confiar um segredo a alguém é o maior sinal de que se gosta,  que há várias maneiras de gostar sem que se atropelem umas às outras. Mas ao 44 anos continuo a não saber falar Inglês como gostaria, continuo a demorar muito a adormecer. Continuo a não gostar de falar nas primeiras horas do dia porque me recuso fazê-lo antes de ter os sentidos alerta. Continuo com a certeza que o silêncio me faz tanta falta como água, que os banhos são excelentes para ter ideias e sei que continuarei indeciso na hora de escolher a refeição, irei detestar sempre beijar quem fuma, praias cheias de gente, trânsito, filas, carne de porco, cheiro a batatas fritas, pipocas no cinema. Continuo resmungão, disciplinado, rigoroso, profissional, com pouca capacidade de delegar porque acho que dificilmente alguém faz melhor que eu. A minha paciência é menos agora que o ano passado e não gosta nada de ser posta à prova. Aos 44 serei melhor amante que até aqui. Ainda não aprendi a gostar dos meus dentes, da minha voz, ainda não acertei no corte de cabelo, continuo com o complexo das pernas tortas mas continuarei generoso, amigo, cavalheiro, bem disposto, divertido e com uma capacidade estranha de lidar muito bem com os grande problemas e de me deixar derrubar apenas com um gesto ou uma palavra fora de tom de uma pessoa de quem gosto ou aprecio. Não sei como será daqui para a frente, mas até agora acho que a melhor reflexão que posso fazer é que sou um tipo porreiro. Apaixonado pelos dias de Outono, porque as cores do chão e o cheio da terra são maravilhosos nessa altura, por cerveja de garrafa, Lambrusco fresco, gelado de menta, arroz de pato. Nesta idade descobri que atum em lata com grão de bico faz maravilhas na casa de um solteirão se houver criatividade e que velas com cheiro são tão importantes como ter sempre uma garrafa de champanhe no frigorifico. Nunca se sabe quando se apaga a vela ou é preciso celebrar com uma garrafa de champanhe. Parabéns a mim, que apesar de ser muito complicado tenho uma tecla que descomplica tudo.  Chama-se verdade. Acredito que usada a verdade é meio caminho andado para não se complicar nada. Verdade, gratidão e algum sentido de humor que me leva a acreditar que cantar pode ser uma saída. Porque gosto de cantar. E Sei que continuarei a fazê-lo, fora de tom, como são as coisas boas da vida que chegam para nos despencar e que agradecemos eternamente tê-las vivido porque nos abanaram o cantinho arrumado onde nos sentimos confortavelmente felizes. Obrigado!

PS: Podia falar do tormento da força da gravidade, dos cabelos brancos, das rugas, das manchas na pele, do que fica para trás… Falamos amanhã. Combinado?

 

 

Agradecimentos:  Açúcar de Mil Cores, para uma festa cheia de cor e saborosa até mais não!

 

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